terça-feira, 28 de abril de 2015

Azul - MLVI


(...) De madrugada deixei Cárpatos e não olhei para trás. A meu lado uma menina italiana desenhava peixes e ovelhas e barcos. Perguntei-lhe o que mais gostara da ilha e ela disse-me que tinham sido os bigodes dos gatos e uma velha muito pequenina. Perguntei-lhe como se chamava e ela disse-me que era Sara, e às vezes Giulia, ou Cristina, ou Silvia, ou Martina, ou Anna.
Não olhei para trás e tentei adormecer. Não há caminhos para fora de uma ilha, só voltas ao mesmo, ideias circulares rodeadas de azul. Todos os homens deveriam ter uma no meio do mar, onde deixassem os amores que sobram e dias que já não podem ser vividos.
Afinal, que há-de a gente fazer?



Nuno Camarneiro
Expresso, 19/o1/2o13

Gerrit Komrij


Ela dança sobre pregos



Versos magoam, a folha angustia.
Dão guinadas no corpo, infernais.
É o teu mal: leste poemas a mais.

Melhor perderes-te em música obscena,
Melhor deitares-te a ouvir a cantilena
Do fogo consumindo uma pirotecnia,

Melhor rebolares-te em sei lá quê
Do que a dor e o decoro de quem vê
Ir-se a vida na Paixão da Poesia.



Gerrit Komrij
(1977)

Contrabando, uma antologia poética, Assírio & Alvim, 2005
(trad. Fernando Venâncio)

domingo, 19 de abril de 2015

Vermelho - LXXXI



Léo Ferré
Thank you Satan
(1961)
DVD: "Léo Ferré au Théâtre des Champs-Élysées" 
(1984)