quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

"Loufried", Gottingen

"Desci e me dirigi à rua que se chama Herzberger Landstrasse. Era por volta do meio-dia. As calçadas estavam desertas mas avistei, em um jardim, um rapaz que conversava ao telefone sem fio. Esperei que desligasse, aproximei-me e perguntei:
    -Pode me dizer se a casa de Lou Andreas-Salomé é muito longe? -Lou Andreas-Salomé? Nunca ouvi falar. Mas... Um momento, por favor! Vou consultar o Serviço de Informações Culturais.
E após alguns instantes:
    -Ah! (com ar de surpresa) é nesta mesma rua, o n.º 101. Eu não sabia! Deve ficar bem lá em cima.
Agradeci mais uma vez e continuei a subir a ladeira lentamente. As casas foram se espaçando, os jardins crescendo e, de repente, diante de um estreito caminho em declive como uma picada no bosque, uma seta onde se lê Lou Andreas-Salomé Weg . Caminho de Lou Andreas-Salomé!

Desço por esse caminho e encontro um pequeno espaço sombrio, coberto de folhas e cascalho , limitado por uma cerca de arame além da qual há algumas casas ajardinadas. Acima, sobre a colina, um prédio em tons de bege e laranja que destoa na paisagem. O único som é o do sussurro do bosque. E de repente, passos. Surge junto à cerca uma velhinha com uma sacola de compras. Dirijo-me a ela.

    -Bom dia! A Senhora pode me informar qual dessas casas pertenceu a Lou Andreas-Salomé? -Naturalmente! Era ali onde está aquele edifício. Nós tivemos de vender a casa. -Ah!... a Senhora é da família? -Bem, mais ou menos... É uma história muito longa e complicada. Mas eu enterrei Andreas e enterrei Lou, disse com orgulho. -... Hum... e... ( meu coração estava aos pulos! ), e a senhora conheceu o poeta Rainer Maria Rilke? -Sim! Mas eu era muito criança, eu não prestava muita atenção neles. (E então acrescentou ingenuamente: ) Não sabia que iriam se tornar tão importantes. Agora, com muita freqüência chegam aqui pessoas interessadas ... fazendo pesquisas. -Pois eu vim do Brasil. - Ach so! Muito longe! Do outro lado do mundo!
    Para descobrir o nome dela, disse-lhe o meu e estendi-lhe a mão.-Maria Apel. Sorriu amavelmente e pediu licença, estava atrasada. -Muito prazer! E muito obrigada!
Esperei que ela se afastasse e procurei me recompor de tanta emoção. Maria Apel! Maria, com certeza a pequena Marieschen, a filha de Marie, empregada de Lou e de Andreas, com quem este tivera dois filhos, segundo H. F. Peters: um menino, que morreu pequeno, e Marie, cujo nascimento foi mencionado por Lou em uma carta a Rilke que eu lera dias antes, Maria, que havia convivido com Andreas e com Lou até o fim, que conhecera Rilke...

Fui olhar de perto o prédio que se chama, como a casa, Loufried e em cujo jardim há uma pedra onde estão gravados versos de Lou que Nietzsche certamente teria apreciado:


Du heller Himmel über mir
Dir willich mich vertrauen
Lass nicht von lust und leiden hier

Den Aufblick mir verbauen.
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Tu, claro céu sobre mim
A ti quero me confiar
Que prazer e tristeza aqui
não me sejam negados por teu Olhar".


Rachel Gutierrez






1 comentário:

  1. Oi. Gostei bastante deste texto e gostaria muito de conversar com você a respeito desta experiência que teve em Gottingen. Podes me contatar? Obrigada. E-mail: michellya.ribeiro@gmail.com

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