"Cresce atrás das coisas como incêndio de verdade". (Rilke - trad. MariaT.Furtado)
quinta-feira, 20 de janeiro de 2011
Atrás dos Tempos
Atrás dos tempos vêm tempos
Eu pego na minha viola
e canto assim esta vida a correr.
Eu sei que é pouco e não consola,
nem cozido à portuguesa há sequer.
Quem canta sempre se levanta,
calados é que podemos cair.
Com vinho molha-se a garganta
se a lua nova está para subir.
Que atrás dos tempos vêm tempos
e outros tempos hão-de vir.
Eu sei de histórias verdadeiras,
umas belas e outras tristes de assombrar,
do marinheiro morto em terra
em luta por melhor vida no mar,
da velha criada despedida
que enlouqueceu e se pôs a cantar,
e do trapeiro da avenida
mal dormido se pôs a ouvir.
Que atrás dos tempos vêm tempos
e outros tempos hão-de vir.
Sei de vitórias e derrotas
nesta luta que vamos vencer.
Se quem trabalha não se esgota
tem seu salário sempre a descer.
Olha a polícia, olha o talher,
olha o preço da vida a subir.
Mas quem mal faz por mal espere,
o tirano fez janela para fugir.
Que atrás dos tempos vêm tempos
e outros tempos hão-de vir.
Mas esse tempo que há-de vir
não se espera como a noite espera o dia,
nasce da força que transpira
de braços e pernas em harmonia.
Já basta tanta desgraça
que a gente tem no peito a cair.
Não é do povo nem da raça
mas do modo como vês o porvir.
Que atrás dos tempos vêm tempos
e outros tempos hão-de vir.
Fausto
Madrugada dos Trapeiros
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