quinta-feira, 12 de julho de 2012

Vida

   - Não, senhor, não sou escritor. - respondi, reagindo de imediato.
     - E os papéis escritos que vi? Os papéis sobre os quais caiu de sono.
     - Conto a mim mesmo a minha vida. É tudo.
     - E isso não é ser escritor?
     - Não quero ser escritor, mas sim escrever, que é uma coisa muito diferente. Não sei se capta a diferença subtil.
      (...)
      - Parece-me que a vida não existe em si mesma.
      - Então o que existe?
    -Quero dizer que a própria vida não existe por si mesma, pois se não a contámos, essa vida é somente algo que transcorre, nada mais. Está a seguir-me?
       - Estou.
       - Penso que para agarrar e compreender a vida há que contá-la, nem que seja apenas à almofada ou a si mesmo.

Enrique Vila-Matas
Longe de Vera Cruz, Assírio & Alvim, 1995

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