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As minhas cobaias afirmam que, à frente do quiosque dos jornais, na tabacaria, ao entrar no comboio ou na casa de banho de um restaurante, cruzam com outras pessoas a dizeram umas para as outras, em voz alta: "Vês, é mesmo o Tal". "Tens a certeza?" "Claro, é mesmo ele". E continuam a sua conversa amavelmente, enquanto o Tal sente que eles não se importam que ele os ouça, como se ele não existisse.
Ficam confusos com o facto de um protagonista do imaginário "massmediático" entrar de repente na vida real, mas, ao mesmo tampo, perante a personagem real, comportam-se como se ela pertencesse ainda ao imaginário, como se aparecesse no écran ou numa fotografia de uma revista e eles estivessem a falar na sua ausência.
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Os mass media primeiro convenceram-nos de que o imaginário era real e agora estão a querer-nos convencer de que o real é imaginário. Quanto mais realidade os ecrãs nos mostrarem, mais cinematográfico se torna o mundo de todos os dias. Até que, como queriam alguns filósofos, acabaremos por pensar que estamos sós no mundo e que todo o resto é o filme que Deus, ou um génio maligno, nos projecta à frente dos olhos.
(1989)
Umberto Eco
O Segundo Diário Mínimo, Difel, 1993
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