Não sou mulher de superstições.
Nunca fui.
(...)
Mas desde há muitos anos (e quando digo "muitos" é mesmo "muitos"...) que não transijo num pormenor: nunca me visto de verde.
(...)
Até que há dias tomei uma atitude verdadeiramente heroica.
Tinha sido convidada para um programa de televisão, em directo, e a única recomendação que me tinham dado era "não vista riscas nem bolas".
Foi então que pensei:
- É agora! Nada melhor para acabar de vez com esta tolice.
Vai daí, no próprio dia da emissão (para não me arrepender à última da hora...) entrei no El Corte Inglês (desculpem lá a publicidade...) subi por aquelas escadas acima, e vá de mexer em todas as camisolas que encontrava para ver se descobria alguma que me pudesse servir para a ocasião.
Finalmente encontro uma camisola verde, verde mesmo, verde a sério, verde-que-te-quero-verde. Nada de hesitações, pago, peço que tirem todas as etiquetas porque - confesso à empregada, espantada com a minha pressa - "é para usar já!".
Com ela vestida meti-me num táxi e corri para os estúdios.
Prendem-me um microfone à camisola (verde), e lá me sentam ao lado da jornalista, que está ligada pelo ouvido à régie onde - segundo depreendo - lhe estão a dar alguma ordem de última hora.
Ela diz-me qualquer coisa muito baixinho e eu não ouço, e ela tem de repetir, mas só à terceira vez é que eu a entendo:
- Da régie estão a perguntar se não se importa que a sua camisola vá aparecer azul em vez de verde... É que o cenário atrás de si é verde, e por isso temos de mudar a cor, senão não se distingue nada. Vai aparecer de azul... Não se importa?
E lá apareci no ecrã. De azul. (...)
Alice Vieira
A Camisola Verde
Jornal Sénior, 5/12/2003
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